controlar a dor

cravando pregos bem fundo, descobrimos o sangue, o nosso, o da madeira, o de todos.

os nós dos dedos estalam e a negra lenha recebe mais uma cunha de aço cravada, qual tacha superflua mas presente, numa linha contínua já aberta.

e a madeira ficou, qual faquir, sangrando ao sol.

a essência da razão

os ciclistas preferem sempre os percursos naturais.
o acto de preferir pedalar e sentir odores, brisas e vistas é uma opção naturalista - poderá não ser intencional, mas é-o na sua essência.
conjugar essa postura com as presenças construtivas que pontuam os seus percursos, pode resultar num complicado exercício de esquizofrenia, porque - muitas vezes - a paisagem urbana que abraça o ciclista é muito má!

ajustes milimétricos

os da imagem...
da obra, a precisão, só mesmo a das intenções

confluencias

vivendo no meio da construção civil, oiço muitas vezes a expressão "o betão é o melhor amigo do homem!"
não sei se surgiu por piada a algum cão, ou por brejeirice à moda do "curral das moinas", ou apenas por constatação da evidência do betão ser efectivamente o melhor amigo de alguns homens; poucos, mas de alguns...
o vislumbre diário de algumas estruturas desmesuradas provoca-me nervos. não entendo a necessidade de esbanjar recursos e território para enfatizar as infra-estruturas.
os felizes comtemplados com esta imagem diária - um viaduto ferroviário - receberam-na depois de já viverem durante trinta anos com uma auto-estrada como paisagem.
talvez alguém pensasse que era pouco...

existencias partilhadas

a vida em comum resume-se muitas vezes a isto:

um traço grosso, irregular, predestinado mas nunca premeditado. algumas dúvidas, algumas presenças e também por vezes, alguns erros. mas um percurso sempre contínuo.

a última imagem de ontem

mais uma vez poderia ser sem palavras.

também poderia ser num local qualquer, subúrbio, desconhecido, esquecido.

será possivelmente de uma grande importancia para quem o frequenta, mesmo que já não saibam dizer porque o frequentam.

não confirmei se era loja, colectividade ou qualquer outro derivado de sociedade civil local.

ficou-me a imagem de equilíbrio entre necessidade e desenrasca,

e eu reconheci o retrato do país...

vista, vistas e o que se vê - 2

onze anos antes,

a opção era outra

e justifica a opção de hoje,

aparentemente...

também naquele dia me interroguei se faria sentido sentar-me de costas para o meu motivo, mas o que me sensibiliza o olhar não justifica o acto urbano, muito menos o fundamenta...

os edis referirão as verbas disponíveis

os votantes, os eventos quaternários

os passantes - como fui neste dia -

estão demasiado ocupados em cumprir a agenda dos monumentos entremeados com a doçaria regional e a cerveja nacional.

reposicionar um - ou vários - bancos de jardim, quando não há jardim, não deveria ser polémico,

mas neste caso, antes de ser polémico, é estranho.

parece apenas que pretenderam virar costas ao lixo...

(que só ali está para facilitar o percurso de recolha - porque não são os passantes ou os utentes do parque de estacionamento que justificam aqueles metros cúbicos de resíduos...)

vista, vistas e o que se vê - 1

as nossas opções são sempre questionáveis
e é muito importante questionarmo-nos
e pôr em dúvida.

à primeira vista esta imagem é um contra-senso:
a luz,
o calor
a paisagem,

tudo aponta para que "as vistas" fossem as outras

perspectivas

quase nunca os vemos,
porque é sempre uma questão de focagem,
ou de equilíbrio entre o que olhamos e o que procuramos.

a forma e a cor foram escolhidas para facilitar a visibilidade, mas mesmo assim, passam-nos ao lado.

quando procuramos uma determinada perspectiva de uns volumes construídos, surgem em todo o seu esplendor reluzente...

um pipo

na beira da estrada.
obviamente, o local mais provável para os encontrar, e de muito boa qualidade... o pipo, claro.
vinho, nem vê-lo

um instante...

hoje o pai ficou no hospital, e eu lembrei-me de ti...

obviamente, a foto não é minha. foi tirada por alguém que carinhosamente chamáva-mos de "tavares".se ele me conseguir ouvir, muito obrigado por este instante

uma visita...

fui visitar a casa - em construção - de um amigo.

e isto foi o que encontrei...


simples colunas a espreitar o céu,
emoldurando o laranja do horizonte.
não as contei
nem as contarei.

não quero distrair o olhar do ponto focal,
porque - para mim
-não existem muitos momentos assim...

felizmente há quem os tenha todos os dias

uma questão de ética

não sou um fiel seguidor de nada, nem religião, nem clubites, nem políticas.
tenho simpatias, e gosto de as expressar, mas nada de mais.

por vezes penso que deveria ser mais afirmativo
e seguir o exemplo taliban e, qual 'The Fountainhead' passar à acção bombista.

passar vários anos a aprender como renovar e recuperar o nosso património, os momentos, os percursos,

mesmo quando a qualidade particular de cada construção não é individualmente revelante, mas imprescíndivel enquanto parte de um todo.

retirar alumínios descabidos em vãos que pedem a madeira do passado,

tirar o cimento do muro de cal,

limpar o lixo acumulado nas juntas das pedras do pavimento

para ficar com um par de antenas de uma suposta televisão por cabo, cuja razão de existir é a de retirar as antenas das coberturas e melhorar a qualidade das transmissões eliminando as perturbações decorrentes das variações atmosféricas!!!

haja vergonha!

pedra a pedra

na sombra do muro, fugidia, escreve-se a tua vida,
as tuas cores,
a existência mundana.
podemos olhar a cal e contar as pedras, uma a uma,
todos os dias.
podemos não as contar,
e todos os dias respirar, em suspiro,
por uma outra existência,
uma outra cor.

parcerias estratégicas

passagens

nem o inferno australiano faz esquecer as saudades do verão...

acessos 6

o mosaico cultural, interracial, que se encontra em muitos edifícios de habitação colectiva de promoção pública - muitas vezes ditos "per" - origina coloridos visuais e verbais por vezes muito interessantes, outras vezes preocupantes.
concentrá-lo num mosaico estrutural monocromático poderá ser uma aposta interessante.
o futuro o dirá...

acessos 5

uma escada sobre outra escada,
ambas separadas por um fio de ar por onde as gentes passam.

"o que é isto, pai? parece um desenho..."

"é só um prédio com uma escada à frente"

acessos 4

nunca fui dos previlegiados que subiam estas escadas para megulhar ou apenas banhar-se na piscina.

não que o acesso me fosse vedado.

não que não quisesse.

apenas falhou a oportunidade.

agora vou regularmente a este parque.

agora subo estas escadas.

agora, como todos os outros, interrogo-me do porquê.

onde está a água!?

acessos 3

ou três acessos num só...